quinta-feira, 19 de novembro de 2009

NORTE - OPINIÕES

"Primeiro, as verdades.

O Norte é mais Português que Portugal.
As minhotas são as raparigas mais bonitas do País.
O Minho é a nossa província mais estragada e continua a ser a mais bela.
As festas da Nossa Senhora da Agonia são as maiores e mais impressionantes que já se viram.
Viana do Castelo é uma cidade clara.
Não esconde nada.
Não há uma Viana secreta.
Não há outra Viana do lado de lá.
Em Viana do Castelo está tudo à vista.
A luz mostra tudo o que há para ver.
É uma cidade verde-branca. Verde-rio e verde-mar, mas branca.
Em Agosto até o verde mais escuro, que sevê nas árvores antigas do Monte de Santa Luzia, parece tornar-se branco ao olhar.
Até o granito das casas.
No Norte a comida é melhor.
O vinho é melhor.
O serviço é melhor.
Os preços são mais baixos.
Não é difícil entrar ao calhas numa taberna, comer muito bem e pagar uma ninharia.
Estas são as verdades do Norte de Portugal.
Mas há uma verdade maior.
É que só o Norte existe.
O Sul não existe.
As partes mais bonitas de Portugal, o Alentejo, os Açores, a Madeira, Lisboa, et caetera, existem sozinhas.
O Sul é solto.
Não se junta.
Não se diz que se é do Sul como se diz que se é do Norte.
No Norte dizem-se e orgulham-se de se dizer nortenhos.
Quem é que se identifica como sulista?
No Norte, as pessoas falam mais no Norte do que todos os portugueses juntos falam de Portugal inteiro.
Os nortenhos não falam do Norte como se o Norte fosse um segundo país. Não haja enganos. Não falam do Norte para separá-lo de Portugal.
Falam do Norte apenas para separá-lo do resto de Portugal.
Para um nortenho, há o Norte e há o Resto.
É a soma de um e de outro que constitui Portugal.
Mas o Norte é onde Portugal começa.
Depois do Norte, Portugal limita-se a continuar, a correr por ali abaixo.
Deus nos livre, mas se se perdesse o resto do país e só ficasse o Norte, Portugal continuaria a existir. Como país inteiro.
Pátria mesmo, por muito pequenina.
No Norte.
Em contrapartida, sem o Norte, Portugal seria uma mera região da Europa.
Mais ou menos peninsular, ou insular.
É esta a verdade.
Lisboa é bonita e estranha mas é apenas uma cidade.
O Alentejo é especial mas ibérico, a Madeira é encantadora mas inglesa e os Açores são um caso à parte.
Em qualquer caso, os lisboetas não falam nem no Centro nem no Sul - falam em Lisboa. Os alentejanos nem sequer falam do Algarve - falam do Alentejo.
As ilhas falam em si mesmas e naquela entidade incompreensível a que chamam, qual hipermercado de mil misturadas, Continente.
No Norte, Portugal tira de si a sua ideia e ganha corpo.
Está muito estragado, mas é um estragado português, semi-arrependido, como quem não quer a coisa.
O Norte cheira a dinheiro e a alecrim.
O asseio não é asséptico - cheira a cunhas, a conhecimentos e a arranjinho.
Tem esse defeito e essa verdade. Em contrapartida, a conservação fantástica de (algum) Alentejo é impecável, porque os alentejanos são mais frios e conservadores (menos portugueses) nessas coisas.
O Norte é feminino.
O Minho é uma menina.
Tem a doçura agreste, a timidez insolente da mulher portuguesa. Como um brinco doirado que luz numa orelha pequenina, o Norte dá nas vistas sem se dar por isso.
As raparigas do Norte têm belezas perigosas, olhos verdes-impossíveis, daqueles em que os versos, desde o dia em que nascem, se põem a escrever-se sozinhos. Têm o ar de quem pertence a si própria. Andam de mãos nas ancas. Olham de frente. Pensam em tudo e dizem tudo o que pensam. Confiam, mas não dão confiança.
Olho para as raparigas do meu país e acho-as bonitas e honradas, graciosas sem estarem para brincadeiras, bonitas sem serem belas, erguidas pelo nariz, seguras pelo queixo, aprumadas, mas sem vaidade. Acho-as verdadeiras. Acredito nelas. Gosto da vergonha delas, da maneira como coram quando se lhes fala e da maneira como podem puxar de um estalo ou de uma panela, quando se lhes falta ao respeito. Gosto das pequeninas, com o cabelo puxado atrás das orelhas, e das velhas, de carrapito perfeito, que têm os olhos endurecidos de quem passou a vida a cuidar dos outros. Gosto dos brincos, dos sapatos, das saias. Gosto das burguesas, vestidas à maneira, de braço enlaçado nos homens.
Fazem-me todas medo, na maneira calada como conduzem as cerimónias e os maridos, mas gosto delas. São mulheres que possuem; são mulheres que pertencem. As mulheres do Norte deveriam mandar neste país. Têm o ar de que sabem o que estão a fazer. Em Viana, durante as festas, são as senhoras em toda a parte. Numa procissão, numa barraca de feira, numa taberna, são elas que decidem silenciosamente. Trabalham três vezes mais que os homens e não lhes dão importância especial. Só descomposturas, e mimos, e carinhos. O Norte é a nossa verdade.
Ao princípio irritava-me que todos os nortenhos tivessem tanto orgulho noNorte, porque me parecia que o orgulho era aleatório. Gostavam do Norte só porque eram do Norte. Assim também eu.
Ansiava por encontrar um nortenho que preferisse Coimbra ou o Algarve, da maneira que eu, lisboeta, prefiro o Norte.
Afinal, Portugal é um caso muito sério e compete a cada português escolher, de cabeça fria e coração quente, os seus pedaços e pormenores. Depois percebi. Os nortenhos, antes de nascer, já escolheram. Já nascem escolhidos. Não escolhem a terra onde nascem, seja Ponte de Lima ou Amarante, e apesar de as defenderem acerrimamente, põem acima dessas terras a terra maior que é o 'O Norte'. Defendem o 'Norte' em Portugal como os Portugueses haviam de defender Portugal no mundo. Este sacrifício colectivo, em que cada um adia a sua pertença particular - o nome da sua terrinha - para poder pertencer a uma terra maior, é comovente. No Porto, dizem que as pessoas de Viana são melhores do que as do Porto. EmViana, dizem que as festas de Viana não são tão autênticas como as de Pontede Lima. Em Ponte de Lima dizem que a vila de Amarante ainda é mais bonita. O Norte não tem nome próprio. Se o tem não o diz. Quem sabe se é mais Minho ou Trás-os-Montes, se é litoral ou interior, português ou galego? Parece vago. Mas não é. Basta olhar para aquelas caras e para aquelas casas, para as árvores, para os muros, ouvir aquelas vozes, sentir aquelas mãos em cima de nós, com a terra a tremer de tanto tambor e o céu em fogo, para adivinhar. O nome do Norte é Portugal. Portugal, como nome de terra, como nome de nós todos, é um nome do Norte. Não é só o nome do Porto. É a maneira que têm de dizer 'Portugal' e 'Portugueses'. No Norte dizem-no a toda a hora, com a maior das naturalidades. Sem complexos e sem patrioteirismos.
Como se fosse só um nome. Como 'Norte'. Como se fosse assim que chamassem uns pelosoutros.
Porque é que não é assim que nos chamamos todos?'
Miguel Esteves Cardoso"


Agradeço o e-mail de Nuno Feliz que me deu a conhecer este texto... Já tinha lido algumas partes há alguns anos atrás quando ainda nem residia no Porto...

Este texto não enriquece a cultura de ninguém e por isso nem nunca me tinha debruçado a ler com mais atenção...

O 1º livro que li de Miguel Esteves Cardoso "O AMOR É FODIDO" ilucida bem que tipo de escritor nos é apresentado... Tinha uns 16 anos quando me foi oferecido...
Nasceu em berço de ouro pois dificilmente o pobre da Mouraria se escrevesse este livro e procurasse uma editora... encaminhavam-no para ajuda psiquiátrica! No entanto ainda bem que este senhor escreve e continua a teimar em escrever livros pois os hábitos de leitura são escassos em Portugal e ao menos quando surge um nome conhecido lá vão os portugueses salivar para as livrarias... Nem todos felizmente! LOL É esta a verdade.
A verdade é um ponto de vista.
Em alguns pontos de vista concordo com este Sr. mas em outros aspectos "Valha-me Deus"! LOOOLLL
Confesso que sorri espontaneamente quando li "olhos-verdes" impossíveis... Algum fóra deve ter tido... LOL
"Mulheres do Norte deviam mandar neste país. Têm o ar que sabem..." FELIZMENTE GRANDE PARTE DOS PORTUGUESES ESTÃO FARTOS DE APARÊNCIAS!

Nem perco mais tempo de vida a analisar este texto...

6 comentários:

  1. Já que fui eu quem deu a conhecer este texto que originou comentários que demonstram algum desconhecimento deste cantinho chamado Portugal, principalmente do chamado Portugal Profundo, e fui "desafiado" a colocar aqui a minha resposta, aqui vai.

    Em primeiro lugar o que eu acho piada é que estes textos são sempre escritos por alguém de LISBOA, E para confirmar a minha teoria, mais um blog sobre as diferenças Porto/Lisboa, escrito por?

    Parabéns! Acabou de ganhar um serviço de jantar de 32 peças! A resposta está certa! UMA LISBOETA!

    O autor do texto em questão, (não sendo dos meus preferidos antes pelo contrário), não deixa de ser mais um gajo de Lisboa com teorias sobre o norte, mas em algumas coisas tem muita razão.

    A primeira tem a ver com os “OLHOS VERDES IMPOSSÍVEIS” só quem nunca se aventurou pelas vilas e aldeias do Minho e de Trás os Montes, é que não sabe a enorme quantidade de pessoas que têm olhos verdes e azuis lindíssimos. É a herança do Sangue Celta, povo que durante muitos anos ocupou esta região, ao contrário do pessoal do Sul que normalmente tem olhos negros ou castanhos, fruto do Sangue Mouro. E não tem a ver com o facto de vos chamarmos Mouros, são factos científicos.
    Mas como não há regra sem excepção, existem povos africanos como por exemplo os Touaregs, que têm olhos de um azul impressionante.

    Em segundo lugar realmente quando nos perguntam de onde somos dizemos que somos do Norte e defendemos o Norte como um todo, enquanto que se perguntarmos a alguém lá de baixo, dizem o nome da terra de onde são, mesmo os lisboetas se lhes perguntares dizem que são de Odivelas, Cacém, Loures, etc. Não dizem que são do Sul ou do Centro.

    Agora reconheço que como é apanágio do autor, diz lá muita treta.

    Só para terminar, o texto Cultura Lisboa vs Porto, é mais um exemplo de um texto escrito por alguém que não é do Nuorte! Pois anda perto, mas tem muitas incoerências com o modo como os Tripeiros falam.

    Citando um grande Nortenho (Fernando Rocha): E MAI NADA!

    Nuno Feliz

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  2. "Parabéns! Acabou de ganhar um serviço de jantar de 32 peças! A resposta está certa! UMA LISBOETA!"

    Nunito Nunito Nunitooo

    E porque não de 36 peças? LOL

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  3. Este texto do Miguel Esteves Cardoso sobre o Norte (nunca fala no Porto!) é fraquinho, aliás como muito do que ele escreve hoje em dia (para minha tristeza), mas dito isto, alto e para o baile, que o MEC escreveu até hoje das mais refinadas e buriladas prosas que se escreveram neste cantinho da Europa.
    Se o "Amor é Fodido" não é do meu gosto, daí a ser uma Merda vai um grande passo.
    São opiniões... seria por certo um elogio ao MEC ser considerado um mau autor por este blogue, as tantas, digo eu...

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  4. É um belíssimo texto e 'MAI NADA.

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